Eu nunca pratiquei uma arte marcial, mas com o conhecimento que tenho sobre o assunto, sempre tive noção de que sem perseverança, esforço e dedicação, seria praticamente impossível um praticante conseguir evoluir. Pois para o bem e para o mal, Sifu se escora nessa ideia para nos levar por uma fascinante viagem em busca de vingança.

Sifu

Desenvolvido pela Slocap e com versões para PC, PlayStation 4 e PlayStation 5, Sifu começa mostrando cinco lutadores invadindo uma escola de artes marciais. Após realizar um verdadeiro massacre, o líder do grupo confronta o mestre do local, uma pessoa que em cantonês é conhecida como… sifu.

Mesmo lutando bravamente, o professor acaba sendo morto por Yang, mas a tragédia ainda não havia terminado. O filho do sifu é encontrado pelos assassinos e o líder ordena que um dos seus comandados acabe com a criança.

O que eles não sabiam era que o garoto estava usando um talismã mágico, uma joia que tinha a capacidade de reviver seu dono. O problema é que ao fazer isso o usuário veria sua idade avançar mais rapidamente, por outro lado, seria graças a ele que o menino teria não apenas uma segunda chance, mas uma terceira, uma quarta, uma quinta…

Com oito anos tendo se passado desde aquele trágico evento, o(a) protagonista se tornou um bom lutador e resolve partir em busca do quinteto que realizou o ataque. Porém, ele ainda terá muito o que aprender e é aí que entra a principal mecânica do jogo.

Um beat ‘em up com elementos de roguelike

sifu

Inicialmente, Sifu pode parecer apenas um jogo de briga de rua em três dimensões, onde teremos que enfrentar diversos inimigos para avançarmos pelas fases, até encontrarmos um chefe no final. Ele nos permite usar alguns objetos como armas, realizar combos usando os mais de 150 golpes disponíveis, mas as semelhanças acabam por aí.

Quem está acostumado com o gênero certamente sentirá falta dos itens que servem para restaurar nossa energia e o motivo para isso está no fato do título flertar com outro estilo de jogos, os roguelike.

A diferença é que em Sifu a morte não necessariamente será permanente, já que toda vez que formos derrotados pelos inimigos, o talismã do protagonista se encarregará de trazê-lo de volta à vida. O custo para isso será a passagem do tempo, numa ideia muito interessante implementada pela Slocap.

Funciona assim. A primeira vez que morrermos será acrescido um ano na nossa idade. Já na segunda ficaremos dois anos mais velhos e assim por diante. Desta forma, poderemos envelhecer até os 70 anos, quando não teremos outra oportunidade de usar o talismã.

Além de alterar gradativamente a aparência do personagem, essa mecânica também influenciará na jogabilidade, com a força do protagonista aumentando com o passar do tempo, mas a sua resistência diminuindo. As únicas maneiras de diminuir esse contador será adquirindo um item nos santuários espalhados pelas fases ou derrotando inimigos especiais — normalmente identificados por uma espécie de fumaça ao seu redor.

Para piorar, ao chegar aos 70 anos perderemos todas as habilidades que tivermos aprendido durante a jogatina, exceto se a tivermos desbloqueado definitivamente. Para isso será necessário “comprar” a habilidade cinco vezes, o que demandará o gasto de uma grande quantidade de experiência.

Outro detalhe importante na maneira como essa passagem de tempo funciona em Sifu é ao derrotar um chefe. Ao contrário do que o jogo diz, voltar para um estágio que já concluímos não nos fará perder tudo o que conquistamos até ali, mas sempre voltaremos com idade que chegamos aquele estágio. Assim, se você derrotou o segundo chefe estando com, digamos, 30 anos, sempre que iniciar o terceiro estágio o protagonista aparecerá com essa idade.

Esta é a maneira encontrada pelos desenvolvedores para nos incentivar a refazer fases concluídas, já que assim poderemos continuar a história com uma idade mais baixa. Porém, como a repetição será constante em Sifu, nem todos gostarão de ter que refazer uma fase, várias e várias vazes.

Desafio digno dos grandes mestres

sifu

Sifu é mais um daqueles jogos que acendem o debate sobre o quão punitivo um título deveria ser. Para alguns, jogos muito difíceis deveriam trazer uma opção para avançarmos por eles de maneira mais tranquila, com uma dificuldade tão alta servindo apenas para afastar um público mais amplo.

Eu entendo esse argumento e até concordo com ele, mas também acredito que uma desenvolvedora tem todo o direito de entregar sua obra da maneira como a idealizou e no caso do Sifu, essa alta dificuldade se encaixa perfeitamente na sua proposta.

Por se debruçar tanto no universo das artes marciais, penso que só através da dificuldade o jogo conseguiria nos passar uma melhor noção de estarmos evoluindo e ficando cada vez mais perto do objetivo final, que é vingar a morte do nosso pai.

Isso impedirá que muitas pessoas joguem e principalmente, se divirtam com Sifu? Não tenho a menor dúvida disso, mas quem disse que se tornar um lutador habilidoso e capaz de derrotar cinco mestres seria fácil? Talvez este seja um pensamento elitista, mas como os criadores do jogo optaram por usar o desafio para nos fazer imergir naquele universo, acredito que a decisão deva ser respeitada.

O balé dos combates

Caso você tenha a resiliência para avançar pelas fases de Sifu, encontrará uma bela homenagem não apenas aos filmes de Kung Fu, mas a arte marcial na sua totalidade. Com as batalhas seguindo o estilo Bak Mei (que é fortemente baseado nos golpes com as mãos), o estúdio teve como consultor Benjamin Colussi, um mestre nesse etilo de luta.

O resultado foi um título com uma movimentação impressionante, com os golpes desferidos tanto pelo protagonista quanto pelos seus adversários passando a sensação de estarmos assistindo um bom filme do gênero. Some a isso a necessidade de desviarmos e nos defendermos dos ataques sendo algo imprescindível para o sucesso, fazendo com que uma luta nunca seja igual a outra.

Também me agradou muito a direção artística adotada pelo estúdio, com os cenários contando com muitos detalhes e a trilha sonora nos fazendo sentir como se estivéssemos explorando uma cidade chinesa. Eu só gostaria que poder ouvir a dublagem em chinês.

De volta aos velhos tempos, mas com alguma modernidade

Com as pessoas tendo cada vez menos tempo para se dedicar aos videogames, Sifu é uma experiência que certamente não pode ser recomendada a qualquer um. Para ter sucesso aqui e conseguir encontrar alguma diversão, o jogador precisará de muita dedicação, paciência e reflexos apurados.

Isso infelizmente fará com o que o jogo se torne restrito a um relativamente pequeno grupo de jogadores. A sensação de estarmos prestes a perder o nosso progresso e de não sermos capazes de chegar ao seu final será constante, mas não era justamente assim que funcionavam diversos ótimos títulos que adoramos na época dos fliperamas?

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Pai em tempo integral do pequeno Nicolas, enquanto se divide escrevendo para o Meio Bit Games e Vida de Gamer, tenta encontrar um tempinho para aproveitar algumas das suas paixões, os filmes, os quadrinhos, o futebol e os videogames. Acredita que um dia conseguirá jogar todos os games da sua coleção.